Muquiranas Brasil, o novo reality da HBO, proporciona ao espectador um dos raros prazeres da vida moderna: ver na TV alguém mais fudido que você.
Não fudido de dinheiro, claro. O fudido em questão é 100% mental. No primeiro episódio, Vanderlea revela ser dona de TRÊS IMÓVEIS — algo que ela atribui às pequenas economias em casa, como não descartar o fio dental no primeiro uso.
Muquiranas segue o formato de Extreme Cheapskates (2012-14), programa responsável por apresentar aos americanos personagens como Roy Haynes: o homem que, ao fim do próprio casamento, catou do chão o arroz que os convidados tacaram e guardou pra jantar no dia seguinte.
No episódio em questão, Roy e a mulher comemoram bodas de prata com uma caminhada (grátis!) em torno do mesmo cartório onde casaram. Por acaso, eles encontram restos de arroz de alguma cerimônia recente — e Roy prontamente abaixa pra faturar mais uma refeição.
É um raciocínio diferenciado. Na cabeça do Roy, dez minutos ciscando arroz na calçada — e matando a mulher de vergonha — compensam porque é uma boquinha grátis; mesmo com um punhado de arroz custando cerca de 40 centavos, o que estimaria o tempo dele em R$ 2,40 a hora.
Raphael assistiu comigo a temporada e apelidou essas manobras mentais de muquirana math. São duas táticas: a primeira é presumir que o seu tempo, conforto e qualidade de vida valem zero. Em Muquiranas, Vanderlea alega economizar mais de cinco mil reais ao ano deixando de comprar papel higiênico, sabonete e xampu. Grana forte, hein! Dá até pra imaginar esse dinheiro todo bancando algum pequeno luxo, como, por exemplo, um estoque anual de papel higiênico, sabonete e xampu.
A segunda tática consiste em jogar o valor economizado lá em cima, pra pão-durice não ficar tão indigesta. Aí vai da criatividade de cada um. Roy estima em oitenta dólares anuais (R$ 450) a economia de levar sachê de ketchup pra casa. Quem me dera; capaz que eu tenha mais dinheiro guardado na porta da geladeira que na poupança.
Pra Clívia — cujo próprio nome parece reaproveitar um Cláudio e Lívia que alguém jogou fora —, o vestido de noiva que ela acabou de comprar num brechó por 200 reais pode ser revendido, após a cerimônia, por dois e quinhentos. Tem mesmo alguém por aí disposto a morrer nessa grana em um vestido usado POR MAIS DE UMA NOIVA? Não importa. Só de imaginar dois mil reais de lucro em cima do casamento, ela já abre um sorrisão.
Clívia, aliás, é uma figura. Um dos momentos mais divertidos do programa é quando aparece o figurino MALUCO que ela e o marido usam numa ida ao brechó. Ela de boina vermelha e cachecol tricolor, no maior estilo abertura-das-Olimpíadas, ornando com uma inexplicável jaqueta militar; ao lado, o marido num suéter de veludo azul com um boá branco fixado entre o zíper e a camiseta.
Uma estética confusa, bastante diferente das roupas normais que eles usam no resto do episódio. Nem a produção chegou a comentar o visual, talvez descartando como uma excentricidade qualquer (no meio de tantas piores). Foi muito engraçado quando a gente se deu conta de que na verdade os dois estão fantasiados de gente rica, pra tentar convencer a vendedora de que as roupas que eles trouxeram pra vender são de grife.
Assim funciona a mente do muquirana: um arremedo de estratégias, trapaças e espertezas que economizam um total de oitenta centavos ao mês.
A essa altura, talvez você esteja se perguntando que sentido faz acumular tanto dinheiro e continuar vivendo desse jeito. De que adianta a conta bancária cheia se você toma banho de roupa pra não gastar com lavanderia, ou sai na TV com a cabeça torta depois de cortar o próprio cabelo?
Pior, será que tanta economia não leva a gastos maiores no futuro? Certamente o americano que cospe enxaguante bucal num potinho pra reutilizar ao longo da semana deve ter contraído alguma infecção, e antibiótico por lá custa uns três mil enxaguantes. A conta não bate.
Cabe então um esclarecimento: a vida do muquirana brasileiro é relativamente higiênica. Relativamente. É chocante a Vanderlea usar o mesmo pedaço de fio dental de janeiro a maio?, é chocante!, mas pelo menos ela usa fio dental. Houve um esforço. E a Marli, que reaproveita papel higiênico mijado na limpeza do fogão? Palavra-chave: limpeza. Tudo é uma questão de contexto.
Por que é que nós, os pródigos, que torramos nosso salário em futilidades como detergente e papel higiênico, criticamos aqueles cujo simples prazer é economizar? Será que a nossa reação seria a mesma diante de um monge, cuja aparência humilde cultiva desapego ao mundo material?
Ah, agora a coisa mudou de figura. Agora você se fudeu. No pensamento budista, as vestes representam um esforço em usar o que houver de mais barato e mais acessível; algo com que o mão-de-vaca certamente se identifica. O hábito da Marli usar calcinha de defunto não deixa de ser uma espécie de aperfeiçoamento espiritual. Qual o problema? Te incomoda a iluminação alheia?
Eu, que acima de tudo sou uma grande entusiasta do espírito humano, não me incomodo. Que deus abençoe os unhas-de-fome desse país. E que venha a segunda temporada!!
Falando em esperar uma nova temporada, hora de tirar o atraso do Telegram.
Laurinha, por favor fale de MUQUIRANAS BRASIL (R. V.)
Acabei de falar. Vocês nem prestam atenção…
o q vc acha do Gustavo Scat pedir ajuda que n consegue emprego de ator mais desde q descobriram q ele curte trepar cagando? acha q ele merece? (P.)
O que mais tem no Twitter é discussão da trepada do outro. Como se faz, quando se faz, com quem ou quantos. Que que pode, que que não pode. Dia inteiro essa merda. Pode ser chato abrir o site e encontrar os mesmos debates reciclados, as mesmas brigas — eu com certeza me estresso. Mas o importante é que toda essa discordância tá encaminhando a gente pra um belo futuro, no qual todos nós pensamos e agimos sobre sexo de forma exatamente igual. Aponta pra fé e rema!
Quando li o nome da postagem achei que fosse sobre nós, assinantes não premium.
muito agradecido da Laurinha colocar o comentário sobre muquiranas em um post gratuito, acessível para todos (principalmente nós muquiranas)