aprendendo a virar gente com o tiktok
um método infalível
Quando um estranho me vê na rua, com meus óculos remendados de superbonder nos dois lados, qual é a impressão que ele tem de mim? Categoria. Distinção. Status. Se uma amiga assiste Youtube aqui em casa e repara que no intervalo o algoritmo me entrega promoção de hambúrguer em posto de gasolina, qual imagem vem à mente dela? Sucesso. Prestígio. Glamour.
Por mais almejado que seja o meu estilo de vida, ele também traz suas responsabilidades. Todos os dias o telegram recebe súplicas dos meus pobres leitores pedindo uma luz, um conselho, uma frase capaz de arrancá-los dessa vida infeliz. Laurinha, me ajuda. Tou ficando com um cara que corta unha do pé em cima do cinzeiro. Minha psicóloga tirou licença pra entrar no Casamento às Cegas. A cachorra cagou a casa toda. Responde ou eu vou me matar amanhã no estacionamento da Telhanorte.
Não existe uma solução fácil, claro. O que resolve o problema de um pode não resolver o de outro, e quando o assunto é mudar de vida nenhum método é infalível. Tendo dito isso, hoje eu trouxe pra vocês um MÉTODO INFALÍVEL pra MUDAR SUA VIDA EM QUATRO PASSOS — usando apenas o Tiktok.
APRENDA A VIRAR GENTE EM QUATRO PASSOS COM O TIKTOK
UM MÉTODO INFALÍVEL
1º PASSO: HIDRATAÇÃO
Se nesse exato momento você não estiver à beira de mijar nas calças, sinto muito, mas você não leva sua vida a sério. Um corpo saudável é um corpo hidratado, e um corpo hidratado passa um terço do dia no vaso.
Infelizmente, a experiência de beber um gole d’água é uma das mais desagradáveis que um ser humano pode enfrentar. Como solução, muitos no Tiktok apelam pro copo Stanley, que além de manter o interior gelado por mais tempo também ajuda o meio ambiente, diminuindo o consumo de plástico. Cada uso do copo evita o desperdício de duas garrafas descartáveis — o que é facilmente demonstrado nesse vídeo da heysweetkay, em que ela enche seu copo Stanley com duas garrafas descartáveis.
Parabéns à querida pela atitude sustentável! Um exemplo pra todos nós.
2º PASSO: REDECORAR
Por muito tempo eu acreditei que não fosse meu lugar de fala, como moradora do 1º andar, essa coisa de ficar trocando a decoração da casa. Cada vizinho tem o seu papel: o de cima rearranja espontaneamente os móveis às três da manhã, e o de baixo espera amanhecer pra ouvir Maiara & Maraisa no talo.
Mas a vida moderna é um longo e exaustivo exercício de empatia. Ao contrário do instagram, que todo dia te mostra os mesmos vinte vídeos de resgate de cachorro e criança peidando, o tiktok proporciona uma espécie de turismo cognitivo: entrar na pele do outro por dois minutos e ver como ele pensa. Rolando o feed numa noite insone, eu me deparei com o arquétipo da Vizinha de Cima em pessoa:
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É preciso admitir que a moça em questão abre o vídeo de forma extremamente simpática. “Meia-noite de um domingo…. e se eu trocar todos os móveis de lugar?”, seguida de uma risada pigarrenta, é talvez a única introdução que me faria solidarizar com o estado mental da gata. Se antes o impulso da reorganização noturna me parecia um claro caso de CPM (comportamento de pessoa maluca), agora eu me encontrava reinterpretando como um CPN, ou até mesmo um CQEME (comportamento que eu mesma exibo).
Joguei fora o tapete da cozinha, montei uma estante no quarto — tudo violando a lei do psiu, claro. Mudei o arranjo das louças no armário. Por fim, a imersão completa: arrastar a escrivaninha de um quarto pro outro, curtindo o atrito, tomando meu tempo. As pernas riscando o chão de madeira igual um trompete. Héééééééé. Que alegria, meu deus. E hoje cedo a vizinha de cima o quê? Ouvindo Medo Bobo. As delícias da dialética…
3º PASSO: ALIMENTAÇÃO
Um dos hábitos mais transformadores que alguém pode cultivar é uma alimentação saudável. Já dizia Sócrates: a comida é o alimento do corpo.
Nesse sentido, muitos criadores do Tiktok te incentivam a começar sua jornada culinária — mas nem todo incentivo é realista. O chef Rui Morschel, por exemplo, tem um vídeo ensinando a fazer “COMIDA PARA UMA SEMANA EM 02H!!!”. Boa hein? Duas horas! Quem não tem duas horinhas pra cozinhar no domingo? Aí vai ver e o cara suja um microprocessador, uma tábua de corte, três panelas, seis travessas e sete utensílios. (Fiz questão de contar.) O único jeito de um serviço desses durar 2h ao todo é se depois de cozinhar você pega a comida e se muda.
Se uns pecam pela falta de realidade, outros pecam pelo excesso. O perfil Chácara Cristal mostra uma senhorinha mineira fazendo tudo do zero: o grão de café ela mesma torra e mói, o peixe ela cria numa caixa d’água no quintal. Até aí tudo bem; o problema é descobrir, por meio dos vídeos dela, que a minha comida é a versão falsa de uma comida de verdade.
O vídeo em que ela serve um requeijão de corte todo grudento e amarelado, que não lembra em nada o “requeijão” que eu como, me deixou com a impressão desagradável de que a minha existência é menos real que a dela. Os ovos têm outra cor, a manteiga reage ao fogo de outra forma — fogo esse, aliás, que é de lenha. Até a panela de ferro que ela usa faz a daqui de casa parecer panelinha de brinquedo. Qual a necessidade de jogar isso na minha cara assim? Não sei por que alguém seria tão rude…. não sei se eu preciso dessa negatividade na minha vida!!
Um bom meio termo entre a fantasia e o choque de realidade são os vídeos da Mah Marangoni, que traz a comida caseira do NOSSO dia a dia; o que é dizer que ela não sabe fazer porra nenhuma.
Todo vídeo dela é assim. Começa com ela super feliz, sorrindo, bolinho em mãos. Oba! Mais uma criação Marangoni! Ela então se queima na fôrma — um terrível prenúncio, ignorado — e franze a testa, mas segue otimista. Vai dar tudo certo, galera! Hoje é o dia! A forma solta do bolo, e ela assiste aflita a coisa toda desmontar.
Talvez pareça ingênuo da minha parte confiar que ela realmente não entende o que acontece quando alguém desenforma um bolo direto do forno. Todo mundo nos comentários já sacou que ela faz de propósito. Mas a verdade não vem ao caso; eu acho lindo que nos vídeos dela a alegria resiste ao fracasso. Fico igual criança aprendendo lição de moral com desenho; toda vez que ela se anima pra desenformar o bolo eu me animo junto. É hoje sim querida! Vai que é tua!!!
4º PASSO: FAXINA
Manter a casa imunda é questão de saúde mental. A coisa vai piorando só até certo ponto; chega uma hora que o móvel já acumulou todo pó que é capaz de acumular, e se deixa assim fica igualzinho pro resto da vida. Raro encontrar um ambiente tão estável quanto um banheiro com o rejunte encardido. É um espaço tranquilo, harmonioso, que inspira confiança no amanhã: haja o que houver, a sujeira continua.
Casa limpa é outra história. A faxina é um convite à angústia; pouco a pouco você nota os sinais da desordem tomando conta. Uma gota de molho no azulejo, um fio de cabelo no sofá. Se antes a limpeza era semanal, agora é crônica: todo dia uma varrição, um paninho. Sempre a poeira chegando. Sempre a terrível certeza de uma contagem regressiva pro caos.
Não querendo morar num chiqueiro, mas também tendo horror à ansiedade típica dos maníacos por higiene, só me resta um meio-termo: gostar de faxina. Aceitar, à moda grega, que a própria inconstância da casa é uma constante, e que a varridinha cotidiana pode ser uma fonte de conforto. Pro espírito tranquilo*, a louça suja vira um grande jardim zen.
Dá até gosto cuidar da casa todo dia e ter ela sempre um pouquinho empoeirada e um pouquinho brilhando. Meu banheiro oscila entre a limpeza e a sujeira como um barco nas ondas do mar, e o bom marinheiro não luta contra a maré; apenas repõe o Glade conforme necessário.
*Já os espíritos intranquilos que predominam na audiência deste blog talvez gostem de conhecer a Roda de Tarefas da amandinhatok. A querida montou uma roda virtual de tarefas domésticas que sorteia todo dia uma coisa diferente pra ela resolver em casa. Nesse vídeo aí do link ela limpa a geladeira e fica até surpresa em achar um pote de melão cortado ainda fresco, e então admite que é meio contraditório a pessoa se dizer deprimida sem ter uma fruta mofada pra jogar fora. Bonita reflexão…
a comida é o alimento do corpo 🔥✍️
Olha ela entregando conteúdo às 8h de segunda, tal qual um jornalão